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09/07/2019
Manifesto em Defesa da Vida nos Estádios
A Fundação Thiago de Moraes Gonzaga acompanhou os trabalhos da Subcomissão Mista sobre o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol, fazendo-se presente e contribuindo em todas as reuniões públicas realizadas em Porto Alegre. Dessa forma, podemos dizer com convicção que os argumentos pontuados pelo Governador Eduardo Leite ao vetar o projeto de lei que traria de volta o consumo de álcool aos estádios no Rio Grande do Sul não foram vencidos. O álcool não deve voltar aos estádios de futebol!
 
Se por um lado testemunhamos nessas reuniões contundentes pareceres contrários do Instituto Geral de Perícia (IGP), da Polícia Civil, da Secretaria da Saúde, da Brigada Militar e do Ministério Público, por outro, apenas os clubes de futebol apoiaram a volta da bebida aos estádios, na expectativa de retornos financeiros. Se a Saúde, a Segurança e a Lei nos apontam um caminho, por que deveríamos seguir este outro indicado apenas por quem administra uma das maiores paixões nacionais e ainda assim precisa da bebida para viabilizar seus negócios?
 
Está claro na justificativa dos autores do último projeto de lei que os interesses são meramente econômicos, para atender aos interesses de empresas de bebidas e dos clubes que, ao invés de gerarem receitas através do esporte que é a sua natureza de ser, buscam na comercialização de bebidas uma fonte de renda. Infelizmente, transformam-se em “bares” com o futebol de atração. Será que transformar os estádios em espaços “não seguros” para famílias e principalmente crianças é uma boa estratégia de sobrevivência?
 
A lei federal 10.671/03, conhecida como Estatuto do Torcedor, é muito clara quando determina em seu art. 13-A que “são condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei: (...) II) não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência” (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). O Ministério Público do Rio Grande do Sul, através da Procuradoria do Torcedor, foi taxativo neste ponto, tanto ao subsidiar o veto do Governador quanto em suas manifestações nas discussões desta Subcomissão. Paralelamente e de forma complementar, a Política Nacional do Álcool tem em suas diretrizes “estimular e fomentar medidas que restrinjam, espacial e temporalmente, os pontos de venda e consumo de bebidas alcoólicas, observando os contextos de maior vulnerabilidade às situações de violência e danos sociais”. Por último, importa lembrar que há Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº5112 já tramitando no Supremo Tribunal Federal, questionando iniciativa baiana análoga ao que tem sido proposto aqui, que autoriza o consumo e a venda de bebidas alcoólicas nos estádios daquele estado, questionando se os estados seriam o fórum adequado para esse debate.
 
Mas, muito além dessa questão legal, a Fundação Thiago de Moraes Gonzaga acompanha os posicionamentos da Secretaria da Saúde e dos grupos que junto a Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas – ABEAD, que se posicionaram contra o consumo de álcool nos estádios e a favor da vida! Como indicou a Secretaria, “se as primeiras doses de álcool possibilitam um efeito socializador, no entanto, as doses seguintes podem estimular a violência, agressividade e a impetuosidade, capazes de levar a assumir atitudes de risco, já que ele tem seu poder de avaliação reduzido, sendo um dos problemas de seu consumo em estádios de futebol. Assim, implicando maiores riscos de atos violentos e consequentes traumatismos”. Da mesma forma, o estudo encaminhado a esta Subcomissão por esse conjunto de pesquisadores faz mais duas ponderações:
 
1) “Há uma forte correlação entre o uso de bebidas alcoólicas e o incremento de comportamentos violentos por diferentes causas, sendo uma delas o enfraquecimento dos mecanismos que normalmente restringem nosso comportamento impulsivo e agressivo. Tais alterações são mais fáceis de acontecer em ambientes grupais e sob estímulos específicos, como por exemplo entre jovens ou nos ambientes esportivos ou de torcida organizada, aumentando os riscos de associação entre álcool e violência. Ao mesmo tempo, há evidências de que o banimento do consumo de álcool em eventos esportivos diminui a incidência destas ocorrências. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o uso do álcool está diretamente relacionado à violência, o que justifica inúmeros casos de conflitos em estádios. ”
 
2) “De acordo com as informações já apresentadas – sobre a taxa de transformação do álcool no organismo, para que um torcedor possa sair do estádio e dirigir seu automóvel com segurança, ao consumir apenas duas doses NO INÍCIO DA PARTIDA ele precisaria aguardar 04 horas para zerar o bafômetro na saída do estádio. (...) (estudos demonstram que torcedores em grupo bebem abusivamente) ...”
 
Tendo em vista essas afirmações e considerando que um número expressivo de carros particulares segue lotando os estacionamentos e arredores dos estádios, entende-se que o retorno do álcool a esses ambientes represente um risco à VIDA, não só dos torcedores embriagados como de toda a comunidade local.
 
É do conhecimento dos deputados que as estatísticas são favoráveis à lei atual e elas demonstraram que houve considerável redução da violência nos estádios uma vez sem álcool, que, segundo dados da Brigada Militar, foi de 70%. Em sua nota técnica, a BM é muito clara: “não se vislumbra vantagem alguma para a sociedade gaúcha na liberação do consumo de álcool nas praças desportivas”, favorecendo a criação de condições que gerem fenômenos violentos. A Brigada ainda pontua que “outra decorrência de eventual liberação de álcool será a necessidade do aumento de efetivos disponíveis nos estádios”, demandando pessoal que não mais estará disponível para a segurança do restante da sociedade.
  
Nós, da Fundação Thiago de Moraes Gonzaga, lamentamos a decisão de nossos deputados estaduais na última legislatura, trazendo à tona este tema que já deveria estar superado. Lamentamos que interesses meramente econômicos tenham se sobreposto aos da vida, da segurança e da saúde de nossa população.
Esperamos que os (as) senhores (as) deputados (as) priorizem os interesses da população impedindo que a iniciativa de retorno das bebidas alcoólicas prospere. Só assim poderemos sonhar que os estádios venham a ser ambientes seguros e que “todos” possam voltar para suas casas em segurança ao final de um evento esportivo.
 
A VIDA em primeiro lugar, senhores Deputados, pois a VIDA não pode esperar!
 
Regis Gonzaga
Fundação Thiago Gonzaga